O ministro do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal Superior Eleitoral Gilmar Mendes afirmou que o tribunal nĆ£o terĆ” problemas em cass...
O ministro do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal Superior Eleitoral
Gilmar Mendes afirmou que o tribunal nĆ£o terĆ” problemas em cassar o mandato de
Dilma se a corte constatar irregularidades na campanha eleitoral de 2014 da
presidente.
Na entrevista concedida ao jornal Folha
de S.Paulo, o ministro afirma
que a operaĆ§Ć£o "lava jato" deve investigar se Dilma nĆ£o sabia ou
esteve envolvida nos esquemas de corrupĆ§Ć£o da Petrobras, uma vez que foi
integrante do conselho de administraĆ§Ć£o da estatal e ministra de Minas e
Energia.
O ministro declarou ainda nĆ£o ver problema no fato de sua colega de
TSE Maria Thereza de Assis Moura ser a relatora da aĆ§Ć£o que pede
impugnaĆ§Ć£o do mandato de Dilma.
Leia abaixo a entrevista:
Folha de S.Paulo ā Dilma tem condiƧƵes de chegar ao fim do mandato?
Gilmar Mendes ā Temos muitas discussƵes abertas, como o
impeachment, processos na JustiƧa Eleitoral, mas estamos numa situaĆ§Ć£o muito
difĆcil. Ć preciso encontrar o encaminhamento institucional e nĆ£o podemos
esquecer que, ao lado da grave crise polĆtica temos a crise econĆ“mica, que
exige medidas de quem tem legitimidade, credibilidade e autoridade. Esses sĆ£o
elementos que estĆ£o em falta no mercado polĆtico.
Folha de S.Paulo ā RenĆŗncia seria o caminho?
Gilmar Mendes ā NĆ£o vou emitir juĆzo de valor, mas estou
convencido de que Ć© muito difĆcil chegarmos a 2018 com esse quadro de
definhamento econƓmico.
Folha de S.Paulo ā As investigaƧƵes de corrupĆ§Ć£o
chegando perto do ex-presidente Lula agravam o cenƔrio?
Gilmar Mendes ā NĆ£o se estrutura um sistema dessa dimensĆ£o sem
a participaĆ§Ć£o de atores polĆticos importantes. Tanto Ć© que eu brinquei: esse
enredo nĆ£o entra na SapucaĆ, Ć© preciso que ele seja completado. Todos nĆ³s que
temos experiĆŖncia na vida pĆŗblica nĆ£o imaginamos que um deputado vĆ” Ć Petrobras
e consiga levantar recursos. Ć preciso outro tipo de arranjo.
Folha de S.Paulo ā Dois delatores disseram
acreditar que Lula e Dilma sabiam do esquema...
Gilmar Mendes ā NĆ£o vou fazer juĆzo, mas nĆ£o acredito que isso
nasceu por aĆ§Ć£o espontĆ¢nea de parlamentares que foram Ć Petrobras, Eletrobras,
Eletronuclear e decidiram fazer lĆ” um tipo de partido.
Folha de S.Paulo ā O presidente da CĆ¢mara Ć©
investigado por manter contas no exterior. Diante dessa situaĆ§Ć£o, Eduardo Cunha
deveria se afastar do cargo?
Gilmar Mendes ā A gente tende a falar mal dos nossos polĆticos,
mas, ao longo dos anos, logramos desenvolver uma classe polĆtica muito hĆ”bil,
que propiciou desdobramentos histĆ³ricos interessantes, como a transiĆ§Ć£o do
regime militar para o modelo de 1988. Espero que o segmento polĆtico se inspire
nesses exemplos para encaminhar soluƧƵes adequadas.
Folha de S.Paulo ā Se o Supremo aceitar a denĆŗncia,
Cunha deveria se afastar automaticamente?
Gilmar Mendes ā NĆ£o gostaria de emitir juĆzo de valor.
Folha de S.Paulo ā Alguns deputados questionam a legitimidade de Cunha para avaliar um pedido
de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff.
Gilmar Mendes ā Ć uma questĆ£o interna do Congresso. Mas, por
esse argumento, quem ainda poderia tomar alguma decisĆ£o? O que se diz Ć© que nĆ£o
hĆ” nenhuma prova contra a presidente, mas nĆ³s sabemos que isso nĆ£o se
desenvolveu por geraĆ§Ć£o espontĆ¢nea, e ela estava em funƧƵes-chave desde o
MinistĆ©rio de Minas e Energia, Casa Civil e PresidĆŖncia. Tem ela tambĆ©m
condiƧƵes de continuar a governar?
Folha de S.Paulo ā O PT apresentou um parecer do jurista Dalmo
Dallari em que ele diz que o TSE nĆ£o tem competĆŖncia para cassar mandato de
presidente. O senhor concorda?
Gilmar Mendes ā Eu acho que nem o Dalmo nem o PT acreditam
nesse parecer. Isso nĆ£o tem o menor cabimento. Nunca se questionou a
competĆŖncia da JustiƧa Eleitoral. Ć como dizer que o presidente nĆ£o esteja
submetido Ć s regras bĆ”sicas de uma campanha limpa.
Folha de S.Paulo ā O senhor reclamou que o TSE
estava muito acostumado a chancelar coisas do Executivo. Isso mudou?
Gilmar Mendes ā O tribunal foi vacilante na campanha
presidencial de 2014. O abuso geral da campanha era muito difĆcil de ser
coibido, aumento de Bolsa FamĆlia em marƧo, quem impugna esse tipo de questĆ£o?
O MinistĆ©rio PĆŗblico talvez pudesse ter sido ator mais presente. Pelo menos na
JustiƧa Eleitoral, parecia meio cooptado. Acredito que jƔ vivemos um novo
momento.
Folha de S.Paulo ā NĆ£o teria problema de enfrentar
cassaĆ§Ć£o de presidente?
Gilmar Mendes ā NĆ£o. NĆ£o Ć© nada desejĆ”vel, mas, se houver
elementos, o tribunal poderĆ” se pronunciar sobre isso, como tem se pronunciado
em outros casos de senador, deputado, prefeito e vereador.
Folha de S.Paulo ā Como o senhor recebeu a decisĆ£o de que a ministra Maria Thereza de Assis
Moura foi mantida na relatoria de uma das aƧƵes de cassaĆ§Ć£o?
Gilmar Mendes ā Ć uma decisĆ£o normal, uma das possibilidades. O processo estarĆ” em boas mĆ£os.
Folha de S.Paulo ā Mas o fato de a ministra ter votado pelo arquivamento da aĆ§Ć£o nĆ£o terĆ”
influĆŖncia no andamento do processo?
Gilmar Mendes ā Acho que o tribunal superou esse entendimento [arquivamento] de maneira expressiva, 5 votos a 2, e certamente ela terĆ” que conduzir o processo sob as diretrizes estabelecidas pelo plenĆ”rio. E existem muitos elementos que vĆ£o permitir uma adequada avaliaĆ§Ć£o sobre o pedido. O importante Ć© que, tendo em vista os fortes indĆcios, o TSE optou por abir a aĆ§Ć£o.
Folha de S.Paulo ā No Congresso do IDP, os juristas vĆ£o discutir questƵes estruturantes do
constitucionalismo brasileiro. O senhor acredita que o desgaste pelo qual passa
a presidente Dilma tambƩm Ʃ motivado pela crise do presidencialismo?
Gilmar Mendes ā Ć inequĆvoco que esse, como se diz politicamente, presidencialismo de coalizĆ£o, essa junĆ§Ć£o de base, se exauriu. Basta ver a multiplicaĆ§Ć£o de partidos e a dificuldade de se somar apoio com alguma consistĆŖncia programĆ”tica. As negociaƧƵes se sucedem e parece que Ć© um quadro em que os agrupamentos polĆticos continuam insaciĆ”veis.
Folha de S.Paulo ā O senhor defende o parlamentarismo?
Gilmar Mendes ā Chegamos hoje a um quadro de comprometimento da governabilidade e precisamos reagir. Temos que ver qual Ć© o modelo, a saĆda. Veja que fizemos tentativas de intervenĆ§Ć£o judicial com questĆ£o da fidelidade partidĆ”ria, com a questĆ£o do financiamento. A prova de que chegamos ao fundo do poƧo Ć© o estado de nĆ£o governabilidade que nos encontramos.